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Beethoven concluiu a encomenda de três quartetos feita pelo príncipe russo Nikolaus Galitzin em novembro de 1825, com o Quarteto Op. 130. Mas ele tinha mais a dizer neste gênero: continuou compondo e, em maio de 1826, escreveu para o editor Schott, em Mainz, que tinha terminado mais um quarteto: o Op. 131, que vamos ouvir hoje.
Em seu estudo sobre os quartetos de Beethoven, Joseph Kerman fala da tendência à dissociação presente nos dois anteriores ao Quarteto Opus 131: o Op. 132 e, principalmente, o Op. 130. Neste último, um sentido deliberado de dissociação é intensificado pela sucessão de cinco movimentos, às vezes em tonalidades remotas, que produzem o efeito de peças características de uma suíte barroca. Prossegue Kerman:
“Como que em reação a este estudo de dissociação musical (que é o Op. 130), Beethoven escreveu em seguida a mais integrada de suas composições de grande escala. Deste ponto de vista, o Quarteto em Dó Sustenido Menor, Op. 131, pode ser considerado como o ponto culminante de seu esforço como compositor. Os sete movimentos se fundem uns nos outros e, pela primeira vez na música de Beethoven, existe uma conexão temática inequívoca e empática entre o primeiro movimento e o último – não uma reminiscência, mas um paralelo funcional que ajuda a ligar, a dar unidade a esta que é uma obra da mais profunda sutileza, da mais profunda beleza.”
O quarteto começa com um movimento lento, coisa que Beethoven não fazia desde a Sonata ao Luar, de 25 anos atrás. Trata-se também de uma fuga complexa. Os críticos geralmente dizem que ela lembra Bach, mas Basil Lam vai mais longe: “Beethoven volta a uma polifonia anterior a Bach. O episódio canônico, que começa no compasso 65, tem a beleza remota de mestres de até antes de Palestrina, Josquin, ou Dufay”.
A Fuga é de tremenda profundidade e carga emocional. Berlioz a chamou de aterrorizante. Wagner escreveu, citando o Fausto de Goethe: “o Adagio inicial, certamente a coisa mais triste jamais escrita em notas, eu o chamaria de ‘o nascer de um dia que, em todo seu longo curso, não realizará um desejo, nem um único desejo’”.
O solitário uníssono em Dó sustenido no fim da fuga leva à brilhante tonalidade de Ré maior do segundo movimento, um Allegro Vivace, claro e gracioso.
Baseado em uma melodia que se repete, este quase moto perpétuo dá lugar ao terceiro movimento, um segmento breve, mas intenso, em estilo operístico, quase.
Se o terceiro movimento é o recitativo, então o quarto é a Ária, um conjunto de seis variações que constitui o centro lírico deste quarteto, cujos centros de gravidade, se podemos assim dizer, estão nos extremos. O tema consiste em dois blocos de oito compassos. Cada seção repetida é de grande simplicidade. A linguagem musical é aqui extremamente sublimada e incrivelmente contemporânea.
Surge, então, o momento mais próximo de uma pausa em toda a obra. O violoncelo rosna, iniciando um turbulento Scherzo. O Scherzo e o Trio são repetidos duas vezes.
Na coda, Beethoven usa o efeito que é conhecido como “patas de rato correndo em cima de vidro quebrado”, ou “sul ponticello”, em que os músicos tocam com os arcos bem perto da ponte do instrumento.
Depois de uma peça de transição, vem o tempestuoso final. Estamos de volta ao Dó sustenido menor pela primeira vez desde a abertura. À medida que Beethoven desenvolve o movimento, ele vai criando elos de ligação com o que veio antes, em particular com a primeira fuga. Cria assim o sentido de um grande círculo que se fecha.
Quanto à Coda, as opiniões são divididas: alguns veem nela uma furiosa vitória, outros a consideram trágica, ainda outros, ambígua. Wagner foi quem melhor disse:
“É a dança do mundo inteiro – a louca alegria, o grito de dor, o êxtase do amor, a suprema beatitude, a mágoa, o frenesi, o motim, o sofrimento, o zigue-zague do relâmpago, o estrondo do trovão; e acima de tudo isto, o extraordinário violinista que, de redemoinho a vórtex, tudo comanda e tudo conduz à beira do abismo.”
Beethoven – Quarteto nº 14 em Dó Sustenido Menor, Op.131 | Quarteto Alban Berg