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O sueco Ingmar Bergman acreditava que a “música é a arte mais próxima do cinema”. Ele achava “as palavras suspeitas”; as notas musicais eram “mais confiáveis, os sinais mais perfeitos entre criador e intérprete”.
Diferentemente de muitos cineastas que usam a música como uma forma subordinada, de modo a apoiar e suplementar a narrativa do filme, na produção de Bergman, a música é parte da narrativa, inextricável do resto da obra.
Seu filme Sonata de Outono conta a história de Charlotte (Ingrid Bergman), uma pianista famosa que visita a filha Eva (Liv Ullmann) depois de sete anos. Eva tem mágoa de sua mãe por esta não ter cuidado dela quando criança, dando preferência à sua carreira.
Bergman usa a música de maneira comedida, mas extraordinária aqui. Nenhum filme tem uma cena como aquela em que Eva e Charlotte tocam em sequência o Prelúdio Op. 28 nº 2 de Chopin. A interpretação que cada uma dá à peça revela aspectos profundos de suas personalidades, que um diálogo não poderia revelar com tanta concentração e intensidade.
A pianista Käbi Laretei (ex-mulher do terceiro casamento de Bergman) interpreta a obra duas vezes: primeiro como uma estudante, depois, com a maestria e a sutileza de uma concertista.
Eva, desajeitada, com seu cabelo cuidadosamente trançado, óculos e trajes simples abotoados até a garganta é a expressão da contenção e da repressão. Mas ela é também passional, atormentada e mística (por conta da presença que sente de seu filho morto, Erik). Em sua interpretação do Prelúdio, Eva encontra um espaço musical para expressar as emoções reprimidas. Embora amadorística, claudicante, é comovente ouvir a música revelar a dor que ela não pode verbalizar. A expressão artística e a expressão pessoal de Eva estão integradas.
Quando chega sua vez de tocar, Charlotte expõe e depois demonstra a verdade do Prelúdio de Chopin. Ela mostra uma aguda compreensão das mensagens emocionais contidas na obra. Há, porém uma discrepância entre a capacidade de Charlotte de entender a complexidade emocional e a sutileza em interpretações musicais e suas limitações pessoais. A expressão artística de Charlotte, como escreve o filósofo Paisley Livingston, “é um substituto” para o contato direto com os outros, tirando “das emoções sua importância e sua realidade”.