
Em 1830, aos trinta anos, Beethoven começa a perder a audição. A situação vai se agravando e, dois anos depois, seu médico lhe aconselha o isolamento no campo. Ele vai então a Heiligenstadt, uma pequena vila perto de Viena. Porém, sua estadia de quase seis meses no campo não traz nenhuma melhora.
Desesperado, Beethoven escreve a seus irmãos uma carta que nunca chegou a ser enviada, conhecida como o Testamento de Heiligenstadt. Nela o compositor afirma:
“Mas que humilhação para mim, quando alguém ao meu lado ouvia uma flauta ao longe e eu não ouvia nada, ou alguém ouvia um pastor cantando e eu novamente nada ouvia. Estes incidentes levaram-me a beira do desespero e, por pouco, não pus fim à minha vida – foi só a arte que me salvou.”
Superada a crise, Beethoven se recuperou e isto o levou a uma segunda fase artística, que ficou conhecida como a “Fase Heroica”, indo de 1803 a 1812. Seus trabalhos nesse período são de grande escala e falam de luta e de heroísmo: do conflito à vitória, das trevas para a luz.
As peças desse período estão agrupadas do Op. 51 ao Op. 100. Destacamos a seguir algumas de suas composições notáveis da segunda fase:
Sinfonia nº. 3, Op. 55 – “Eroica”
A Sinfonia Eroica representa um divisor de águas, não somente na carreira de Beethoven, mas também na história da música. Esta é a obra mais importante do início de sua segunda fase. Seus primeiros esboços foram feitos em Heiligenstadt, talvez antes mesmo do famoso Testamento, que ele endereçou a seus irmãos.
O que Beethoven explora na Eroica são aspectos universais do heroísmo, centrados na ideia de um confronto com a adversidade que leva finalmente a uma renovação de possibilidades criativas.
Beethoven tinha inicialmente dedicado a sinfonia a Napoleão, que considerava como a encarnação dos ideais democráticos da Revolução Francesa. Ele inscreveu na folha de rosto da partitura: “Sinfonia grande intitolata Buonaparte del Signore Louis van Beethoven” (Grande Sinfonia intitulada Bonaparte…).
Em maio de 1804, porém, quando Napoleão se fez proclamar imperador, Beethoven ficou furioso. Ele apagou o nome Bonaparte da partitura com tanta força que fez um buraco no papel. A inscrição na primeira página passou a ser então: “Sinfonia Eroica… per festeggiare il sovvenire di un grand’ Uomo” (Sinfonia Heróica… composta para celebrar a memória de um grande homem).
Sonata nº. 23 em Fá Menor, Op. 57, “Appassionata”
A Sonata “Appassionata” começou a ser escrita por Beethoven em 1803, mas foi interrompida pela ópera Fidelio, sendo terminada somente em 1806.
Até escrever a Hammerklavier, Beethoven considerava a Appassionata sua melhor Sonata. Nela, não há um momento de dúvida de que a trágica paixão se precipita em direção à morte.
Quarteto nº. 7 em Fá Maior, Op. 59 nº. 1, “Razumovsky nº. 1”
O Quarteto Razumovsky n.º 1 era considerado um enigma por seus primeiros intérpretes e ouvintes. Beethoven teria dito sobre a obra: “Isso é para uma geração futura”. A peça foi dedicada ao Conde Razumovsky, patrono das artes que encomendou três quartetos ao compositor.
Comparável à Sinfonia Eroica, esse quarteto excede, como ela, todos os limites anteriormente estabelecidos em seu gênero, explorados aqui ao extremo no tamanho, na forma, na expressão e na exigência de sua interpretação.
PODCAST | Beethoven – Quarteto nº 7 em Fá Maior, Op. 59 nº 1 – “Razumovsky n° 1”
Sinfonia nº. 5, Op. 67
A Sinfonia nº. 5 se tornou a mais famosa sinfonia já escrita, seja como expressão da luta pessoal de Beethoven, seja como um divisor de águas da música ocidental.
A luta do indivíduo por sua autorrealização – ideia que ela representa com uma força sem precedentes – se tornaria o ideal definidor de todo o movimento romântico do século XIX, estando também na raiz da democracia moderna.
Extremamente forte e solidamente estruturada, a música abrange toda a gama das emoções humanas, da tristeza mais profunda à alegria mais exuberante.
Fidelio, Op. 72
Fidelio, a única ópera de Beethoven, conta a história de Leonore, personagem que, disfarçada de homem (Fidelio – fiel), consegue um emprego em uma prisão com o propósito de libertar seu marido, injustamente condenado. A ópera teve uma trajetória tumultuada, sendo revista diversas vezes. Estreada em 1805, somente nove anos depois chegou à sua versão final, em 1814.
Beethoven não era um compositor vocal como Mozart ou Schubert. “Não gosto de compor canções”, disse certa vez, e, sobre Fidelio, afirmou: “Esta ópera vai me valer uma coroa de mártir”.